Da Antiga uma longa e verdadeira história

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Da Antiga uma longa e verdadeira história
por Thiago Assunção
    


Não é de hoje que vemos o extremo leste representado por uma imagem formada pela mídia que só mostra a região com a ótica sensacionalista: "chuva coloca Itaim Paulista em estado de alerta", "três pessoas morrem em chacina na capital". Enquanto isso, eventos ou "boas ações" são sempre mostrados pelos veículos por se localizarem em regiões centrais da cidade por causa da centralização da cultura, de forma geral.
Há poucos casos em que são apresentados eventos ou pessoas que organizam algo em benefício da comunidade. Por conta disso, para que uma ação aconteça os responsáveis devem trabalhar em dobro, buscar patrocínios e, uma vez ou outra, conseguir mostrar o trabalho na mídia e provar que não são apenas chacinas e enchentes que acontecem no bairro. O Itaim Paulista é uma região assim como outras, com problemas devido a sua localização e administração, mas com pessoas dispostas a mostrar que é possivel melhorar.
Buzo, Wagnão e Da Antiga viagens acima da nuvens

Da Antiga é uma pessoa que mostra atitude para fazer a mudança, seja através do break, rap ou do uniforme da Função Pobre Loko. E Da Antiga representa bem a sua função. Nascido no dia 26 de setembro de 1969 (hoje com 42 anos), em um hospital da Av. Brigadeiro Luís Antônio, Antônio Monico de Souza (Da Antiga) morou no Jabaquara, zona sul de São Paulo, por 12 anos. Filho de Antonio Monico de Paula e Marilac Barbosa de Souza, e irmão mais velho de José Marcos e Ana Paula, Da Antiga já têm uma relação 'antiga' com a música. "Eu sempre estive ligado à música black, soul music, funk. Cresci ouvindo Toni Tornado, Wilson Simonal e Tim Maia, por exemplo".
  
No comando do palco durante o aniversário do Itaim Paulista em 2010


No Jabaquara se juntou a alguns amigos e formou o Jabaquara Break. O grupo era composto por ele, Moisés, PEX, Tripa, Nico, Baleia e Orelha. Meados da década de 80, ao passear pela rua 24 de Maio ele assistiu a uma apresentação que fez com que visse o cenário do hip hop de outra forma. "Eu estava passando por lá e vi uma apresentação do Nelsão, do Funk Cia. Eles foram os pioneiros do hip hop nacional. A música que estava tocando era Planet Rock, do Africa Bambaattaa, um fundador oficial do hip hop".
A partir daí ele começou a frequentar mais vezes a 24 de Maio e a conhecer mais pessoas. Depois do Jabaquara, Da Antiga veio direto para o Itaim Paulista e, mesmo distante do centro, continuou a frequentar a região devido aos  compromissos com a dança. Aos 14 anos, para ajudar a família, ele começou a trabalhar em uma sucursal do jornal correio brasiliense e atuou como Office-boy. Nesta área ficou por três anos. Por conta do trabalho ele teve que parar de estudar ao concluir o 2º ano do ensino médio. "Não é desculpa, mas a família foi crescendo e cheguei a um ponto em que trabalhava ou estudava. Mas agora estou correndo atrás para terminar o ensino médio, já que pretendo fazer faculdade".
Em 1990, na praça Roosevelt, Da Antiga conheceu o grupo de Rap Face Negra e em 1993, ele se integrou ao grupo para cantar. "Eu conciliava o Jabaquara Break com o Face Negra, mas chegou um momento em que tive que escolher e fiquei só no Face Negra." Além de cantar ele compunha algumas músicas, mas a maioria eram parceria com outros compositores. Paralelo ao hip hop, Da Antiga trabalhou como almoxarife por oito anos e em seguida como auxiliar administrativo por mais oito anos.
Quando saiu do Face Negra, no ano de 1996, Da Antiga pode reavaliar sua trajetória e se dedicar a outras tarefas que o tornariam conhecido na região.  "Tive mais tempo para estudar sobre o hip hop, fazer oficinas e workshops de rap quando era chamado e até mesmo conhecer mais sobre a arte educação, para informar aos jovens sobre a cultura hip hop." Pouco depois ele entrou para o grupo Tribunal MC, mas ficou na produção por 12 anos e depois DJ, por três anos. Em 2000, o grupo foi convidado para se apresentar no Favela Toma Conta, evento organizado pelo Alessandro Buzo, com quem formou parceria que dura até os dias de hoje.
"Já aconteceram até o momento 22 edições do evento, realizados duas ou três vezes por ano, e eu participo de todas. Sempre fico na produção do evento, até porque tem outras pessoas responsáveis por outras áreas, como o Tubarão, Claudião, Marilda (esposa do Buzo), Cacau Ras". O evento procura trazer grupos de rap para se apresentar na periferia que muitas vezes não teria condições de ir assistir a um show do Gog ou Dexter, por exemplo.
   
Reconhecimento vindo de Gramado/RS fortalece o lado ator


Essa parceria rendeu o convite para atuar no filme Profissão MC (2009), dirigido por Alessandro Buzo e Toni Nogueira. Além dele também foram convidados Criolo Doido, Dan Dan, Neto, Juju Denden, entre outros e com participações especiais de Rappin Hood e Beto Guilherme. Os mesmos apelidos dos atores são usados nos personagens. O filme conta a história de Dan Dan, que tem duas opções: entrar para o tráfico de drogas ou virar cantor de Rap. Ele e toda produção do filme foram premiados com a medalha Galgo Alado no festival de Gramado de 2010 e teve circulação em algumas cidades brasileiras e no exterior, como em Portugal e Japão.

O lado social"Nunca precisei catar comida no lixo, mas já passei por algumas necessidades. Tive que ir atrás de papelão, ferro e latinha pra vender e ajudar minha mãe. Eu vou me esconder disso? Não posso! Fortalecendo a minha gente eu estou em fortalecendo. É isso que faço para o pessoal do outro lado ver que a quebrada não está esquecida. Para a mídia pode ser, mas não para os moradores. É isso que me motiva a trabalhar com meu lado social". Hoje em dia, Da Antiga é agente educacional na Escola Soldado Eder e arte educador na Fundação Casa e no Espaço Suburbano Convicto.
"Como agente educacional eu trabalho há nove anos e arte educador há 16". Devido ao contato com alguns pedagogos, em 2005 ele foi convidado, junto com Buzo, para realizar oficinas com os menores na Fundação Casa. Buzo ficaria responsável pela literatura e Da Antiga pelo Rap. "Trabalhei por dois anos na unidade do Itaim e depois fui para outras." No ano de 2009 ele começou a desenvolver um projeto com a Ong Ação Educativa que atua da mesma maneira, através de workshops nas unidades de outras fundações e também escolas. "Independente do que eles tenham cometido, vemos que os jovens têm talento. Alguns para cantar funk, outros rap, mas eles estão lá dentro e não tem como mostrar para ninguém".
Foto: Marilda Borges/Divulgação   
Em Curitiba, Da Antiga fala de sua participação no filme Profissão MC


Inspiração"Fizemos um evento no Vila Mara junto com Dexter e GOG e percebemos que quando ouvimos 'Pânico na Zona Sul', dos Racionais MC, essa música soou como um grito de guerra pra todos. Como se dissessem: 'vamos acordar que o negócio não está muito bom para quem é negro, para quem é da periferia. Foi ai que nós paramos e falamos: vamos nos preocupar com o lado cultural desse povo. Essa música foi uma grande inspiração para todos nós". Além da música, Da Antiga se inspirou em outras personalidades.

Na época em que dançava break, acompanhou Thaíde em muitos shows. "São essas pessoas que fazem eu aderir a essa militancia. Muitos pararam, mas so os verdadeiros continuaram, isso serve como experiencia para mim. Além de outras pessoas que ainda inspiram como Buzo, Ferrez, Sérgio Vaz. São escritores que trabalham a favor da periferia e que não deixam você desistir."
Da Antiga não fez graduação em hip hop, mas esteve sempre ligado as pessoas mais conhecidas do movimento. "Todos começaram na mesma época, então se formaram juntos, mas hoje tem a internet para saber o que esta acontecendo fora daqui. Meu aprendizado e minha formação academica foi ter amigos como Thaide, DJ Hum, Mano Brown, Edi Rock (racionais)".
   
Junto com amigos, formam uma turma de atitude e respeito ao local de onde vieram


Função Pobre LokoFundada em Maio de 2004, Da Antiga é o presidente deste movimento que é uma das suas maiores conquistas atualmente. "Vimos que a área estava meio carente. Existia muitos grupos de RAP, mas de forma individualista. Então  pegamos alguns grupos como o Tribunal MC, Atitude Suspeita (Itaquaquecetuba), DCM, DVC (Ermelino Matarazzo), Mano Rogério(Guaianases) e Familia Tramóia (Pantanal) para se organizar e promover algumas atividades para unificar estes grupos e fortificar o hip hop na região".
A Função Pobre Loko não é apenas a junção de grupos de Rap reunidos pra subir no palco e cantar, mas também promover ações sociais em algumas comunidades. "Recentemente fizemos um evento para arrecadar alimentos para as pessoas do Jd. Pantanal por conta das chuvas. Convidamos algumas empresas para apoiar, mas nenhuma ajudou. Quem ajudou foram os grupos que estavam envolvidos e os moradores que não tiveram suas casas cheias". O movimento está cresce cada vez mais e já possui representantes em outras localidades como Curitiba, onde o grupo Arquivo Negro toma conta.
Além dos grupos de RAP outras pessoas também colaboram. "Temos o Vagnão, Marquinhos e o Senhor Antonio e a Dona Nélia, donos do bar Tribuna. O bar virou uma sede, sempre que fazemos uma reunião é aqui que nos encontramos".
Neste ano a Função Pobre Loko pretende crescer mais e virar marca de patente (roupas e outros adereços) e Da Antiga não nega a possibilidade de futuramente transformar o movimento em uma ONG.
   
Respeito ao passado é uma virtude marcante do "Da Antiga"


Da Antiga"Foi porque eu comecei lá atras, de 87 para 88 e não poderia ter um pseudônimo mais apropriado já que eu sou um cara quem vem lá de trás, 'da antiga'. Quem me deu este apelido foi o Ronaldo, conhecido como Rcranio, do tribunal MC. Estávamos conversando e vimos que os apelidos só ficavam entre gordinho ou era gordão.
Ele me disse: - Essa não é a sua cara, acho que seu pseudônimo tinha que ser de um cara que vem desde lá de trás, não tem outro nome se não for Da Antiga.

Eu me identifiquei com o nome e quando fui ver já tinha virado uma febre. Depois disso todo mundo já sabia quem era eu e conheciam o meu trabalho!"


Este é o Da Antiga, uma pessoa que faz a diferença no Itaim Paulista do seu jeito.



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